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Rio Parauapebas é vítima de conspiração socioambiental

Com 350 quilômetros de extensão e correndo na direção sul-norte, o Rio Parauapebas foi genuinamente marabaense, passou a ser integralmente parauapebense, mas, com a divisão de Parauapebas para dar origem a Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte, sua nascente ficou localizada neste último município.
Formado pela junção do Ribeirão do Caracol com o Córrego da Onça, ele recebe pela margem esquerda o Córrego da Goiaba, os igarapés Gelado e da Gal e os rios Sossego e Sapucaia; pela margem direita recebe o Igarapé Ilha do Coco e os rios Plaquê, Verde, Novo e Caracol – detalhe: o Rio Caracol é um e o Ribeirão do Caracol é outro.
Em seu alto curso até o Rio Sossego, o Parauapebas é conhecido entre os ribeirinhos como Caracol ou Plaquê. Também recebe o nome de Rio Branco em seus cursos médio e baixo. Ele só é navegável por pequenos barcos em trechos limitados, haja vista ser cheio de corredeiras e pequenas cachoeiras.

1ª EXPEDIÇÃO
Se vivo estivesse, o geógrafo, historiador e professor francês Henri Anatole Coudreau iria ficar decepcionado com o que tem sido feito do Rio Parauapebas mais de um século após sua passagem pelo importante curso d’água. Na semana que vem, precisamente na quinta-feira, 23 de maio, vai completar 115 anos que Coundreau, contratado pelo governo do Pará para fazer levantamentos sobre a rede fluvial amazônica, finalizou uma expedição pelos Rios Tocantins, Itacaiúnas e Parauapebas iniciada em 31 de dezembro de 1897.
O geógrafo, pelas tantas naveganças que fez, tornou-se a primeira pessoa a deixar registros concretos para a história do município de Parauapebas por meio de seu célebre livro Voyage a Itaboca et a L’Itacayuna (em português, “Viagens a Itaboca e ao Itacaiúnas”). O pesquisador escreveu as memórias um ano antes de falecer e, à época, seus textos tornaram-se referência para os trabalhos que viriam a ser desenvolvidos no raiar dos anos de 1900 pelo Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG).

Sobre o Rio Parauapebas, Coundreau anotou que suas margens eram cercadas de mata primária, mas que já se visualizavam ribeirinhos praticando lavoura de subsistência e criando gado. Além disso, descendo o rio, o pesquisador encontrou moradores – isolados e em comunidades – praticando extrativismo vegetal no vale do Parauapebas, próximo de onde se encontra hoje a sede municipal. A região era rica em caucho e castanheiras.
O estudioso chegou ao Parauapebas praticamente por acaso, visto que seu objetivo precípuo era fazer levantamentos sobre o Itacaiúnas. Ocorre que o primeiro deságua no segundo, e assim Coundreau “varou” o Rio Parauapebas pela foz e ficou encantado com o que viu, tecendo observações em seu diário de bordo. Tudo isso contribui para provar, também, que Parauapebas teve passado antes da descoberta de suas jazidas minerais.

115 ANOS DEPOIS
A admiração de Henri Coundreau pelo Rio Parauapebas transformou-se, 115 anos depois, no contemplar de estragos causados pela sanha da fronteira agrícola e da mineração; pelo descaso das autoridades competentes no tocante a saneamento básico; e pela irresponsabilidade humana individual, que é consorciada a todo o processo. O Parauapebas está criticamente em perigo.
A fronteira agrícola e a mineração têm contribuído para o assoreamento pontual do rio, que tem perdido profundidade. A falta de saneamento básico na sexta maior cidade paraense faz com que resíduos sólidos e efluentes sejam despejados, sem qualquer pudor, nas suas margens. E a população – que frequentemente se vale do rio para se refrescar em momentos de lazer – não se preocupa em fazer sua parte, fiscalizando e evitando atirar lixo no curso d’água. Ela, por vezes, é a primeira a fazê-lo.

Um estudo científico intitulado “Diagnóstico da Qualidade da Água do Rio Parauapebas”, produzido por pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA), denuncia que o desmatamento das matas ciliares, a atividade mineradora, a retirada de areia e seixo para construção civil e a expansão urbana não planejada, com a invasão irregular da beira do rio, têm causado impactos nocivos ao Parauapebas. Como moeda de troca, a cada inverno, o rio expulsa centenas de casa, mostrando que ainda tem forças para reagir e sinalizando que chegou primeiro e foi ocupado indevida e irregularmente.

O índice de qualidade da água indica que tem havido transformações graves no rio e que, se nada for feito para conter o desgaste, em futuro não muito distante, a capacidade de uso e reuso do líquido precioso estará comprometida. O rio tem plenas condições de se autodepurar, desde que o processo de degradação seja contido.

ÁGUAS CADA VEZ MAIS RASAS
Rio tem água para drenar 250 Parauapebas, mas está morrendo de ‘sede’

Se na gramática tupi seu nome significa “rio de águas rasas”, na matemática pode enfiar uma régua permanentemente e fazer as contas de tempos em tempos: o Rio Parauapebas está ficando cada vez mais raso. Em outras palavras, está faltando água para ele, que, sem exagero, pode morrer (ou secar) qualquer hora dessas devido às responsabilidades que lhe têm sido impostas por décadas a fio, como se fosse ele, o rio, o causador das necessidades humanas mais insolentes. Parece incoerência um rio “secando” no meio de uma Amazônia tão cheia d’água.
Atualmente, 80% dos 155 mil habitantes da sede urbana de Parauapebas bebem água do rio. Para encher tantas barrigas com o líquido precioso, a prefeitura precisou tramar um plano segundo o qual só com a ampliação do atual sistema seria possível atender a comunidade com plenitude. E apenas em 2015. Para fazer frente à mirabolância que é o crescimento demográfico municipal, somente com vazão de 476 litros d’água por segundo, apontam estudos técnicos.

O problema é que a água que vai parar nas torneiras não volta limpa ao rio. Quando retorna, está em forma de crime ambiental: esgoto sanitário. Um rio poluído gera custos para que sua água seja tratada. E enquanto se trata água aqui, uma adutora dá defeito ali, um cano quebra acolá e um morador desperdiça água tratada em algum lugar. Vão-se embora dinheiro e força de trabalho.
Nesse dilema, o Rio Parauapebas é castigado permanentemente, sobretudo no verão, quando seu nível baixa de maneira drástica, e ele mal dá conta de atender as necessidades básicas, tendo em vista que já vem devassado de outros lugares – com assoreamento e despejo de produtos químicos, entre outros.

De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o rio tem 1,3 quilômetros quadrados de água corrente, à vontade, e o município de Parauapebas está assentado sobre uma das áreas de maior disponibilidade hídrica do país, que é a Bacia do Araguaia-Tocantins, da qual a microbacia do Parauapebas faz parte e drena uma área de 7.474 quilômetros quadrados, o suficiente para afogar cerca de 250 cidades do tamanho de Parauapebas.
Teoricamente, não há razão de ser o fato de faltar água na cidade, já que todos estão em cima de um aquífero potente. Para se ter ideia disso, Parauapebas possui 119 pontos de poços subterrâneos de boa vazão, segundo o Serviço Geológico do Brasil (SGB), os quais dariam para atender boa parte da demanda municipal. Entretanto, como a água que abastece a cidade sai diretamente do rio, que enfrenta o revés do crescimento desordenado, todos padecem.

Reportagem: André Santos

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