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“Cortaram um pedaço do nosso corpo”, diz cacique sobre Rio Paraopeba

IGO ESTRELA/METRÓPOLES

De longe é possível sentir o cheiro de animais mortos próximo ao Rio Paraopeba, em São Joaquim das Bicas, a 22 km de Brumadinho. Índios Pataxós Hã-hã-hãe, da aldeia Naô Xohã, viram as águas cristalinas do afluente do Rio São Francisco se transformar em lama na última sexta-feira (25/1). O rompimento da barragem Mina Córrego do Feijão matou a principal fonte de alimento da aldeia, que hoje conta com 27 famílias, cerca de 80 pessoas. Agora, a comunidade não sabe o que fazer para sobreviver.

“Foi um enterro sem velório. Cortaram um pedaço do nosso corpo. Não tem mais peixe, não conseguimos tomar banho ou lavar as roupas nessa água. O homem branco trouxe destruição. Está acabando com a natureza, mas não vamos sair daqui. Vamos resistir. Estamos aqui para proteger o verde”, disse o cacique Háyó, 28 anos.

Cercado por peixes mortos, ele lembra que o rio reunia animais das mais variadas espécies. “Todos os dias, os homens da tribo vinham pescar. Era o nosso alimento de manhã, de tarde e à noite. Encontrávamos peixes de todos os tipos. Os animais silvestres também vinham aqui beber água”, relatou o chefe da tribo.

A Índia pataxó Cintila, 23, lembra a cena de destruição da última sexta-feira. “Choramos. Vimos os peixes pulando para fora do rio. Presenciamos o fim do Paraopeba e não conseguimos fazer nada”, lamentou. “O que aconteceu foi a Mãe Natureza vomitando o que o homem branco está fazendo”, completou.

A plantação de verduras e hortaliças da comunidade indígena também foi prejudicada, pois não há mais água limpa para fazer a irrigação. “Passamos a sobreviver com ajuda de doações. Os nossos idosos choram até hoje. Não existe mais o Mianga Baixu (expressão que significa água bonita)”, explicou Háyó.

Alerta
Depois do rompimento da barragem, seis prefeituras de municípios da Bacia do Paraopeba, o que inclui São Joaquim de Bicas, emitiram alertas para a população se manter longe do leito do rio, pois o nível pode subir com a quantidade de lama que nele chegou. Bairros foram evacuados, inclusive a aldeia, mas os indígenas decidiram não ficar na cidade e permanecer na parte alta da área de 33 hectares ocupada há um ano e meio.

Em alerta, os indígenas fincaram uma estaca à margem do rio e, todos os dias, acompanham o volume da água. “Temos uma missão aqui e não vamos abandoná-la”, ressaltou o cacique. Eles fazem rondas na mata para verificar se não há nenhuma depredação da natureza.

Tragédia se repete

Há três anos, 19 pessoas morreram e centenas ficaram desalojadas após a barragem de Fundão romper, devastar a bacia do Vale do Rio Doce e afundar em lama a cidade mineira de Bento Rodrigues, em Mariana. Os rejeitos chegaram até a foz do Rio Doce, no Espírito Santo. A Samarco, empresa com participação da mineradora Vale, é uma das principais responsáveis pelo episódio de Fundão.

Cerca de 126 famílias do povo Krenak vivem espalhadas em sete aldeias às margens do Rio Doce. Antes do desastre de Fundão, elas pescavam, caçavam e viviam abastecidas pela água do rio. Com a poluição gerada pela lama de rejeitos, elas se veem hoje dependentes de recursos estatais e da alimentação comprada em supermercados. Não podem plantar e caçar, pois os animais desapareceram da região. O rio segue inutilizável, em um processo de recuperação que pode levar mais de uma década.

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