Passada apenas uma hora da entrega do requerimento, durante a sessão parlamentar desta terça-feira, 14, que solicita a abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar suspeitas de tráfico de influência envolvendo Izabela Jatene, filha do governador candidato à reeleição, Simão Jatene (PSDB), a presidência da Assembleia Legislativa acatou o pedido proposto pelo deputado Carlos Bordalo (PT). A “CPI do Dinheirinho” deve ser instalada oficialmente nos próximos dias, já que ontem mesmo os partidos foram convocados a indicar os membros – cinco, no total – para compor o grupo de trabalho. Por uma questão de proporcionalidade, a base aliada ao governo deve ser maioria dentro da comissão.
“Agora, por meio da CPI, cabe uma investigação séria e isenta do parlamento para comprovar se houve ou não essa relação promíscua. O parlamento não pode deixar de cumprir com o seu dever”, declarou Bordalo, que deve fazer força para ser incluído na comissão. “Agora eu acredito que tão logo sejam definidos os membros, num prazo máximo de um mês, um relatório com os resultados finais da investigação deverá ser apresentado”, declarou.
O deputado Edmilson Rodrigues, em entrevista ontem ao programa Brasil Urgente, da TV RBA, lembrou que o documento entregue à presidência, assinado por 14 deputados, é impositivo, ou seja, pelos termos regimentais, a CPI não pode deixar de ser instalada, mas com o período eleitoral batendo à porta há o risco de a base aliada “trabalhar” para que o início dos trabalhos sejam adiados ao máximo.
“Deputado é representante do povo e o povo quer a investigação, então é preciso que se investigue se houve desvio de dinheiro público, se houve quebra de sigilo fiscal de empresas, se houve crime por parte da Segurança Pública em se desfazer do áudio original, se houve adulteração do áudio divulgado, como o governo diz que houve. Se nada disso tiver ocorrido, as investigações também deixarão isso claro.
Na mesma entrevista, Edmilson relatou que seu pedido de representação feito ao Ministério Público também para investigar as denúncias de tráfico de influência dentro do governo, já estão nas mãos do promotor Firmino Matos. “Ele foi indicado esta semana pelo procurador geral de Justiça, trata-se de alguém por quem tenho muito respeito pelo compromisso que tem com a Justiça, e assim como deve acontecer durante a CPI, poderá convocar os envolvidos no caso para esclarecimentos”, detalhou o parlamentar.
Beto Jatene abastece veículos do governo
Os três postos de gasolina de Belém comprados pelo advogado Alberto Lima da Silva Jatene, filho do governador Simão Jatene, que abastecem carros do Estado, como denunciou o DIÁRIO, teriam custado apenas R$ 155.400, segundo documentos da Junta Comercial do Pará (Jucepa). O curioso é que, segundo o Serasa, os mesmos postos faturam R$ 21,6 milhões por ano – o que seria um verdadeiro negócio da China.
O DIÁRIO verificou na internet postos de combustíveis à venda em Belém. Os valores variam de R$ 3,5 milhões a R$ 6 milhões. “Só um tanque de 30 mil litros custa uns R$ 23 mil e você vai precisar de dois”, estranha o consultor de negócios que atua em Brasília Marcelo Santos. “Não acho que seja possível. Nunca vi isso no Brasil inteiro”.
O primeiro posto de Beto Jatene – o Verdão, na avenida Doutor Freitas, 1546, Pedreira – foi comprado em 2006, ainda no primeiro governo de Simão Jatene. O segundo posto, o Umarizal, comprado em março de 2007, três meses após Jatene deixar o governo, tem mais um sócio: Ricardo Augusto Garcia de Souza, marido de Izabela Jatene, filha do governador. Faturamento: R$ 8,9 milhões anuais.
Em 2012, no segundo Governo Jatene, o Verdão passou a ter como sócio Eduardo Simões Araújo, assessor especial do governo do Estado, com salário de R$ 3 mil. O terceiro posto, o Girassol, foi comprado em 2011, logo no começo do segundo Governo Jatene. Em tudo isso caberia uma investigação da Receita Federal, já que os indícios de corrupção e sonegação fiscal são claros.
FORÇA-TAREFA
Uma força-tarefa criada no Ministério Público faz uma varredura nos contratos de compra de combustíveis para as frotas de veículos da Polícia Militar e Corpo de Bombeiro do Pará. O grupo é comandando pelo promotor Armando Brasil e tem a presença do promotor Nelson Medrado, do Núcleo de Combate à Improbidade Administrativa e à Corrupção (NCIC).
Os trabalhos começaram no último dia 3 e devem durar 90 dias. O objetivo é apurar as denúncias de corrupção envolvendo Beto Jatene no fornecimento de combustível para veículos do Estado. Para isso, serão ouvidas testemunhas, analisados contratos e pagamentos e periciadas imagens que mostram carros da frota oficial abastecendo nos postos do filho do governador.
SOCIEDADE LUCRATIVA
Entre os sócios dos postos de gasolina de Beto Jatene estão o assessor especial Eduardo Simões Araújo, que atua na Casa Civil com salário de R$ 3 mil, e Ricardo Souza, marido de Izabela Jatene.
Vidas de luxos incompatíveis com salários chama a atenção
Chama atenção a rica trajetória da primogênita Izabela Jatene de Souza, 42 anos, professora com mestrado do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal do Pará (UFPA).
Hoje, pela sua condição, ganharia cerca de R$ 6 mil mensais, já que não possui dedicação exclusiva. Seu marido, Ricardo Souza, chefe de gabinete da presidência do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), recebe menos de R$ 20 mil mensais. Como explicar que o casal more num apartamento no luxuoso edifício Neon, no Umarizal, que custa mais de R$ 1,5 milhão? Como um casal cuja renda não chega a R$ 30 mil mensais consegue comprar um apartamento que vale quase 60 vezes o que ganham num único mês?
Mas depois da eleição do pai a vida de Izabela mudou. Em 2011, primeiro ano do segundo mandato do pai, morava no exclusivo Edifício Wing, um dos mais luxuosos endereços da capital. Foi nesse ano que foi flagrada num grampo telefônico autorizado pela Justiça pedindo a lista das 300 maiores empresas do Pará para “buscar um dinheirinho”.
Sua atual morada, um apartamento do Edifício Neon, no Umarizal – onde o metro quadrado é avaliado em torno de R$ 4.800 –, possui 225 metros quadrados. O imóvel desocupado e sem benfeitorias, sem pisos, armários, equipamento de cozinha, ar condicionado, internet, TV a cabo não sai por menos de R$ 1 milhão. Equipado e pronto para morar o preço pode ultrapassar o valor de R$ 1,5 milhão, segundo corretores ouvidos pelo DIÁRIO.
Como o valor do apartamento da filha professora do governador poderiam ser construídas 54 casas populares, oito escolas ou 16 postos de saúde a um custo de R$ 923,04 o metro quadrado, valor médio praticado no Pará em agosto passado de acordo com o IBGE. Um trabalhador que ganha até dois salários mínimos (entre R$ 724 e R$ 1.448), maioria dos moradores de Belém, teria de trabalhar pelo menos 85 anos sem gastar nada para conseguir comprar um apartamento como o que mora a filha do governador .
Aliás, não era somente ela, mas toda a família Jatene que morava no Wing. Eram quatro apartamentos nas mãos da família, pertencentes a Izabela Jatene, Alberto (Beto) Jatene, filhos do governador Simão Jatene, Heliana Jatene, ex-mulher, e Regina Labad, sogra de Beto. A mudança para o Edifício Neon manteve a família unida.
Todos ocupam agora quatro novos apartamentos no prédio. Resumindo: a família toda foi capaz de investir um total de R$ 6 milhões. Apenas o Ministério Público e a Receita poderão dizer se esse “dinheirinho” ao qual Izabela se refere no grampo da polícia ajudou a pagar essa conta.
Reportagem: DOL