Há 40 anos, Ozanan Magalhães abandonou os estudos no interior do Ceará, onde nasceu, e veio para Belém trabalhar. Hoje, com 65 anos, o sonho do vendedor autônomo não é juntar dinheiro e sim, entrar para uma faculdade de Direito no ano que vem. Para isso, ele vem se dedicando há dois anos e dois meses às aulas no Centro de Estudos Supletivo Professor Luiz Otavio Pereira, no bairro de São Brás. Nessa escola funciona o núcleo de Belém do Centro de Educação de Jovens e Adultos (Ceja), uma das modalidades oferecidas pela Secretaria de Estado de Educação (Seduc) no Pará.
Com ensino personalizado, nos Centros de Educação de Jovens e Adultos, os professores ficam disponíveis em três turnos para atender àqueles que querem concluir seus estudos. As aulas são agendadas de acordo a necessidade do aluno. “A grande vantagem desse tipo de ensino é a flexibilidade do horário, o que eu não consegui encontrar em outras escolas. Aqui eu posso conciliar o meu tempo de trabalho com o horário no qual eu possa estudar”, diz Ozanan, que espera concluir o último módulo, em Física, no início de abril e estar apto a prestar o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), no final do ano.
Além de Belém, existem centros especializados em Marabá, Santarém, Abaetetuba e Xinguara e núcleos em Itupiranga, Parauapebas e São Sebastião da Boa Vista.
Ozanan soube da existência do Ceja por meio de um amigo e percebeu a sua grande chance. “Decidi voltar a estudar para estar pronto, como cidadão, para interagir em várias rodas. Você não se torna obsoleto, não fica para trás. Para adquirir conhecimento, não tem idade. Basta a vontade de se instruir”, disse o senhor curioso e falante, fã do filme clássico dos anos 70 “Ao Mestre, com carinho”
Estrelado por Sidney Poitier, o filme inglês mostra as dificuldades sociais e raciais na relação entre professor e aluno. Quando vendia livros didáticos aos professores, o autônomo presenciou várias cenas reais de desrespeito aos mestres e lembrava-se do filme. Hoje, valoriza ainda mais o trabalho dos 116 professores do Ceja no qual estuda, que se dedicam aos alunos com o prazer de educar e formar futuros profissionais. “Os professores aqui não são meros avaliadores, eles têm uma qualificação muito grande e nos estimulam a participar das aulas. Muita gente entra aqui acanhada, por ser mais velho e voltar a estudar, mas os professores cuidam de nos desinibir”, destaca o estudante.
O aluno de Belém que quiser concluir seus estudos através de módulos (disciplinas) ofertados de acordo com a sua disponibilidade, pode procurar, durante o horário comercial, a direção do Centro de Estudos Supletivo Professor Luiz Otavio Pereira, que fica na Rua Deodoro de Mendonça, 53, no bairro de São Brás. As matrículas permanecem abertas durante todo o ano. Em 2017, 2.116 pessoas já se matricularam nessa modalidade de ensino.
Mais de 54 mil jovens e adultos foram matriculados no Pará em 2016
O Ceja é apenas um dos modelos utilizados pela Seduc para a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Cada vez mais reconhecida no Brasil como um direito para milhões de pessoas que não tiveram oportunidade de concluir os estudos, a EJA é direito formalizado em lei, como dever de oferta obrigatória pelo Estado brasileiro a partir da Constituição de 1988 e reafirmado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação- 9.394/96, concebendo a educação como direito de todos.
No Pará, somente no ano de 2016, foram 54.837 jovens e adultos matriculados no ensino Fundamental e Médio, em 243 escolas que oferecem a Educação para Jovens e Adultos. Qualquer pessoa a partir dos 15 anos de idade pode se matricular no ensino Fundamental nessas escolas, basta acessar o www.seduc.pa.gov.br. As matrículas vão até o dia 31 de março. Para o ensino Médio, a idade mínima é 18 anos, sem limite etário.
Outros projetos
Fundamentado na Resolução 48/12 do Ministério da Educação, o projeto “Saberes” assegurou a implementação de novas turmas de EJA, em uma educação comprometida com a compreensão da realidade da comunidade. Em vez de tirar o aluno do campo e levar para a cidade, a Seduc leva a educação para o campo. Por meio de um processo seletivo, professores, tanto da capital como das comunidades rurais, têm oportunidade de lecionar em 50 municípios. O projeto iniciou em 2014 e terminou em 2016, envolvendo 14 mil alunos, em 549 turmas formadas e 522 professores. Essa foi uma das grandes conquistas da EJA.
Já o Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos (Mova) que integra o Programa Brasil Alfabetizado, é uma ação de alfabetização para cidadania, desenvolvida pela Seduc em parceria com o Governo Federal e setores da sociedade civil, em um amplo movimento para a superação do analfabetismo no Pará. A meta firmada é, até dezembro de 2017, atender a 24.759 jovens, adultos e idosos analfabetos no Estado. Esse índice corresponde a 3% do quantitativo de analfabetos do Pará, que em 2010, segundo fontes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), estava em 613.897 pessoas.
Uma das metas do plano de ação da Educação de Jovens e Adultos, incluindo pessoas com necessidades especiais, remanescentes de quilombos, pescadores e indígenas, pessoas em cárcere e em cumprimento de medidas socioeducativas, é elevar a taxa de alfabetização da população com 15 anos ou mais para 91,9% até o final de 2017 no Pará. Até o final de 2016, o índice alcançado foi de 89,9%.
Para isso, é necessário também diminuir o percentual da evasão escolar no estado, que hoje ultrapassa 30%. “Neste ano nós vamos conversar com professores e alunos sobre as melhores formas para evitar a evasão escolar, discutindo necessidades específicas de mudanças, levando em conta uma melhor organização da oferta, em termos de horários e metodologia”, informa Nulcia Azevedo, coordenadora da Educação de Jovens e Adultos da Seduc.
Com isso, a educação no Estado firma- se como prioridade, independente da idade. Assim como Ozanan, milhares de paraenses jovens e adultos vão assimilar diariamente a lição conhecida, mas tantas vezes esquecida: nunca é tarde para aprender.
Reportagem: Syanne Neno